Entre Óculos e Lentes

Nunca parei para pensar o que eu poderia ter em comum com Herbert Viana. Na madrugada de hoje, no entanto, a ficha caiu.

Estávamos no ‘The Maze’ da Tavares Bastos, novos amigos e eu, admirando a belíssima vista da Baía de Guanabara que os menos privilegiados têm ao abrirem as janelas de seus casebres, quando uma pergunta casual me fez rever alguns aspectos de minha vida através de lentes diferentes. Que bandeira é aquela no telhado daquele casebre ali? Ora, uma míope convicta de que ninguém enxerga melhor do que eu, obviamente estava sem óculos; afinal era night. Já sabendo que estava enganada, respondi que a bandeira parecia completamente preta. Expliquei a situação enquanto procurava os óculos na bolsa. Surpreso, Rodrigo perguntou por que não uso lentes. Comecei, então, a contar a minha única experiência com lentes de contato. Um desastre absoluto!

É claro que qualquer mulher adoraria enxergar a cerimônia de seu casamento; ao que Rodrigo observou: até para ter certeza de que está se casando com o homem certo. Só que nenhuma gostaria de macular, com os seus óculos, a aura que envolve uma noiva atravessando a nave central da igreja. Assim, quando fiquei noiva, marquei imediatamente uma consulta no oftalmologista. O teste com as lentes foi um horror! Os meus olhos incharam e lacrimejavam tanto que foi difícil tirá-las. Então, meses mais tarde, conformada com a minha miopia e orgulhosa da minha elegância, entrei na Igreja Nossa Senhora do Bonsucesso ao som de Magnificat.

Voltando a Herbert Viana, se as meninas do Leblon não olhavam para ele por causa dos óculos, problema dele. Os meninos olhavam para mim – e muito – mesmo de óculos, que eram muitos e coloridos como os dele. Eu é que não olhava muito bem para eles, convicta que sempre fui de que enxergo tanto quanto as demais pessoas e ia para as noitadas sempre sem óculos. Problema meu, então. Se Herbert Viana sem óculos entrava com o seu carro pela contramão, sorte dele. Eu sem óculos e sem lentes que filtrassem aquilo que belo e maravilhoso me parecia, entrei pela contramão na minha vida. Mais uma vez, problema meu.

Mas, tal qual Herbert Viana, por trás das lentes dos meus óculos também bate um coração que, por amor aos filhos, não me permite quaisquer arrependimentos; até mesmo porque, Rodrigo, nunca temos a certeza de estarmos casando com a pessoa certa. Os óculos e as lentes de contato servem apenas para sabermos que estamos dizendo sim para aquela que escolhemos. Só.

A propósito, a bandeira era do Flamengo, um tanto já desbotada em seu vermelho e preto e rasgada pela excessiva exposição ao sol, ao vento e à chuva. Pena que os relacionamentos não resistam assim tão bravamente aos contratempos.

Maria Paula

Um comentário:

  1. A "pessoa certa" para alguém num determinado período de sua vida pode não ser a "pessoa certa" anos depois. Gosto de pensar nas escolhas sob a ótica do que é bom ou não, do que gosto ou não gosto. No espaço entre o certo e o errado existe muita coisa. A vida é muito mais isso.

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